quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O PROFESSOR CAMPONÊS

O PROFESSOR CAMPONÊS
Nazaré, 30-01-1974

Certa vez,
Caminhando pela estrada
Em meio à neblina,
Senti-me outro homem.

Fazia um frio terrível.
Eu me sentia estranho,
Eu não era eu,
Talvez existisse outro eu
Que em mim se manifestou
Durante aquele momento.
Eu não me reconhecia.

Não mudei para bom
E muito menos para mal.
Talvez a síntese dos dois.

Pensei em liberdade.
Porque a liberdade
Custa tão caro?
Às vezes pensava em gritar.
Gritar no meio do nada
Mas, não me era possível,
Todos viriam contra mim.
Tentei me libertar
Do meu próprio eu
E pensei, qual seria meu ideal.
Sempre lutei por ele
Desde essa manhã
Que ainda era criança.
Todos devem lutar
Para defender seu ideal,
Seja ele qual for.

Desde que seja nobre
E beneficie o povo.
E quando tivessem ciência
De sua idéia fixa,
Reuniria todos os homens
E formaria uma síntese
Com a opinião de todos,
E destruiria os dogmas religiosos,
E todo o povo cresceria
Com um único ideal.

Talvez esse ideal
Fosse combatido pelo dogma
Mas, quando o ideal torna-se forte
O dogma mostra sua face oculta.

Continuei andando pela estrada
Sem saber para onde ir.
Uma força fria
Como a neblina reinante
Atraía-me para algo,
Sem eu saber o que.

Resolvi deixar-me levar.
Seria eu quem andava?
Nunca me senti assim.
Era tão estranho...
Era tão indecifrável...
Sei que senti
Mas o que, não sei dizer.

De repente, divisei um homem,
Era um camponês.
Entabulei conversa,
Perguntei quem era ele.
A resposta: um homem comum.

Senti um calafrio na espinha.
Será que aquele homem
Sentia o mesmo que eu?
Mas ele não sabia ler,
Também não sabia escrever.
Depois lembrei-me que ele
Também era humano.
Lembrei-me que ele também
Pensava como eu penso
E como todos pensam.
Reprovei-me mas...
É o costume... é o costume
Da sociedade em que vivo.
É sempre assim.

Pedi-lhe um cigarro,
Ele me ofereceu
Com todo prazer.
Ele também fumou um
Enquanto conversávamos
Sobre os preços que aumentavam,
Sobre sua longa caminhada,
Sobre sua miserável e longa vida.
Conversamos sobre a fome,
Ele me da aulas.
Eu era seu discípulo
E, de tanto eu aprender
Sobre a vida e a morte,
Descobri com assombro e surpresa
Que alguém me compreendia.
Sim! Um camponês!
Talvez o leitor não me compreenda.
Se isso acontecer
Só pode ser de propósito.
Um pobre homem sem letras
Ensinou-me uma parte da vida

Em toda a sua escuridão.
Mostrou-me um caminho claro,
Mostrou-me um ideal.

Um homem quase selvagem
Ensinou-me que eu deveria lutar,
Seja lá com que arma,
Para conseguir o que queria.
E lutei como ele me ensinou,
E venci mais um obstáculo.
Nele encontrei a liberdade,
A liberdade de querer viver.

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